quarta-feira, 14 de abril de 2010

LETRA E MÚSICA 06

Nunca é demais ou extemporâneo falar de ou escrever sobre Sir Artur Conan Doyle e sua criação mais importante: a dupla de personagens Sherlock-Watson.
Dois homens sozinhos num pequeno sobrado da Baker Street, em Londres, sem que, num único conto ou capítulo dos muitos livros escritos, sequer numa única frase, houvesse qualquer suspeita de homossexualidade.
Não havia (nem há) por que pensar nisso, sabendo-se do interesse do leitor apenas pelo objetivo maior na literatura policial de mistério, ou seja, a busca da solução para um crime, com a identificação do seu autor.

Embora Doyle não seja pioneiro (deve-se creditar a Edgar Allan Poe a inovação do processo científico na investigação criminal, na ficção), foi ele quem criou o paradigma do romance policial científico, centrado na dedução, na lógica, na matemática do raciocínio preciso, com base nos dados levados para os neurônios do cérebro.
A famosa Agatha Christie se inspiraria em Sherlock Holmes para criar o seu Hercule Poirot, que chegava a se referir a esse processo, ao falar na sua “massa cinzenta”.
Outros escritores têm feito o mesmo, como obrigatória e silenciosa homenagem a Doyle.

Criticada como literatura fácil de ler (justamente por isso), mas difícil de produzir, a ficção policial científica européia impôs-se por sua proposta de pouca ou nenhuma brutalidade do investigador e a desnecessária presença do sexo entre as suas necessidades, ao contrário da norte-americana, com detetives violentos em situações de elevada sexualidade, respeitadas as exceções, merecendo referência os romances de Ellery Queen.

Ressalvada a fidelidade de fanáticos leitores desses escritores puramente racionais, deve-se registrar a atual crescente opção pela tecnologia policial a dominar os processos investigativos nas séries de televisão do tipo CSI. A preferência pelo “show” químico-eletrônico de laboratórios caríssimos de corporações policiais é, contudo, apenas o sinal de que o “leitor” é comodista, trocando sua própria capacidade de raciocinar e imaginar como parceiro do autor, pelo conforto de apenas ver e ouvir o que os personagens mostram e falam, trabalhando em equipe.

Com isso, o leitor perde o melhor da proposta da ficção policial científica de mistério: a possibilidade de descobrir junto com o investigador do livro (ou até mesmo antes dele o revelar), quem cometeu o crime.
Assim como a possibilidade de parar a leitura e levar um dia ou mais pensando nas pistas e nos comportamentos dos personagens envolvidos no caso.

Elementar, meu caro Watson!