terça-feira, 6 de abril de 2010

ACHADOS E PERDIDOS 05

Meu chefe de reportagem no Jornal da Bahia, em julho de 1959, era o Joca (João Carlos Teixeira Gomes). Eu era um “foca”, pescado por Ariovaldo Matos, que editava o suplemento dominical “Tablóide”, para o qual eu escrevia uma coluna de Aeromodelismo desde março daquele ano. Foi ele quem me recomendou para a Reportagem.
Saia da redação sem pauta, porque me cabia apenas cobrir três setores: a Biblioteca Pública, o Hotel da Bahia e a Superintendência Municipal de Transportes Coletivos. Tinha de passar em cada um deles, todos os dias. Ninguém esperava que houvesse qualquer notícia importante em qualquer desses lugares, de modo que minha responsabilidade era apenas a de evitar que o JB tomasse algum “furo” por ali.

Decorridos tantos anos, dias atrás, deram-me a notícia: fecharam o Hotel da Bahia, logo depois do Carnaval.
Ontem passei por sua porta e não vi porta alguma, porque sua fachada ao rés do chão estava totalmente coberta por placas de madeira prensada, formando um comprido tapume à sua volta. Nem pensei em chorar. Mais fiquei foi com raiva. O primeiro grande hotel da Bahia, construído pelo Estado para o ano do Quarto Centenário de Salvador (1949), já havia mudado de nome, quando ficou sob o controle da Varig, passando a chamar-se Tropical Hotel, coisa que ninguém sabia porque na boca do povo continuava sendo Hotel da Bahia.
Agora, acabaram com ele, melancolicamente.
Já ouví dizer que vão implodir o prédio. Não acredito!

No meu papel de “foca”, ele tinha dez anos de inaugurado, eu chegava tímido no balcão da recepção, via os repórteres dos Diários Associados (Diário de Notícias e O Estado da Bahia) e de A Tarde, todos a conversar e trocar figurinhas. No dia seguinte, a cobertura era a mesma nesses três jornais, ninguém furava ninguém.
Eu pedia para ver a lista de hóspedes, sempre com os desconhecidos turistas e homens de negócio, ninguém importante.
Um dia, não acreditei no que li: Emilio Myra e Lopez. Só podia ser ele, o grande psicólogo espanhol, autor do “best-seller” internacional – naquela época, no Brasil, uns poucos milhares de exemplares – “Os Quatro Gigantes da Alma”.
Deixei cair a lista sobre o balcão com absoluto descaso e andei por ali, como a gastar tempo para ir embora, até que voltei ao balcão e pedi o telefone, ligando para o seu quarto.
Ele mandou-me subir e eu fiz algumas voltas pelo saguão, para que os outros repórteres não me percebessem entrar no elevador.
Myra e Lopez abriu a porta, recebendo-me apenas de cueca, descalço, com o peito nú. Mandou-me sentar na cama e deu-me uma entrevista exclusiva, revelando estar na Bahia a convite da Universidade, para tratar da implantação de um setor de orientação vocacional.
No dia seguinte, o Jornal da Bahia foi o único que publicou a notícia de que estava na cidade e do que estava fazendo nela. Um furo consagrador. Gostei da experiência e passei a praticar esse esporte. Foram muitos os meus furos de reportagem.

Hoje quase não existe mais isso. É mais fácil encontrar uma notícia de primeira mão, exclusiva, numa coluna social, do que numa página local. Furo nacional? Impossível. Nem a televisão consegue. As agências de notícias vendem tudo para todos. O mundo está ficando sem graça e a moral dessa história é que onde não há competição, a mediocridade impera.
Quem joga para empatar, perde sempre o campeonato.
Aí, a gente pergunta: inscreveu-se nele pra que?