segunda-feira, 29 de novembro de 2010

BAÍA DE TODOS OS SANTOS

Quando foi descoberta a Baía de Todos os Santos, em 1º de novembro de 1501, escrevia-se “Bahia”. Bahia de Todos os Santos foi o nome dado, também à capitania hereditária entregue a Francisco Pereira Coutinho em 1534. Ao se fundar a Cidade do Salvador, com a chegada do primeiro governador geral do Brasil, Tomé de Souza, em 1549, falou-se em Cidade da Bahia, para dizer que era a cidade que existia na Bahia de Todos os Santos. Não havia outra, ali. Por isso, até o século XX, quem se dirigia à Salvador, dizia: “Vou pra Bahia”. Ainda há quem o diga. Com a divisão do Brasil em “estados”, a Cidade da Bahia deu nome ao Estado da Bahia, do qual era a capital. Ainda é. Fez-se a confusão? Nunca. De acordo com a conversa, já se sabia ou se sabe se o indivíduo falava ou fala na cidade ou no estado, quando dizia ou diz “Bahia”.

Em 1949, o Governador Octávio Mangabeira, comemorando o quarto centenário da cidade, entre outras obras então inauguradas, entregou aos “bahianos” uma rodovia que tomaria o seu nome, ligando o bairro de Amaralina ao arrabalde de Itapoan, já na direção do Aeroporto de Ipitanga, cujo acesso era uma dita “estrada do aeroporto”, asfaltada pelos americanos durante a 2a Guerra Mundial. Essa Avenida Octávio Mangabeira, também asfaltada, nos seus primórdios, passava pelo aeroclube e povoados de pescadores, sabe-se lá o que mais, naquele deserto à beira da praia, que, de repente, se encheu de gente para conhecer e gozar das paisagens até então desconhecidas para a grande maioria da população e que passou a ser a grande atração da classe média, a começar pelos poucos privilegiados que tinham carros importados. Ainda não se fabricava automóveis no Brasil.

Sem que se percebesse, esse benefício foi tirando os olhares, a atenção e o cuidado de cada um e de todos, da Baía de Todos os Santos. A invasão consentida do subúrbio ferroviário, este banhado pelos seus remansos, aquela formada pelos miseráveis que construiram palafitas entre o Lobato e a Ribeira, criou aterros e neles, novos bairros ditos “populares”, que ano após ano contribuiram para tirar das praias da Cidade Baixa (Bogari, na Penha, principalmente) os moradores tradicionais, entregando aquela área a uma quantidade enorme de bares e restaurantes. Na outra extremidade da baía, no Porto da Barra, o advento das linhas diretas de ônibus entre bairros permitiu que a população de outros bairros também ditos “populares”, estes centrais, tivesse acesso fácil e barato à melhor praia da cidade, para quem gosta de nadar. A classe média alta correu para a orla oceânica, não só para os banhos de mar dominicais, mas para morar ali. O primeiro grande efeito disso foi o nascimento do bairro da Pituba e daí por diante, até hoje, surgiram outros grandes empreendimentos imobiliários.

Para a Baía de Todos os Santos, nada. Nem um olhar preguiçoso.

Em face a este abandono, que se estende por todo o Recôncavo, onde estão cidades históricas e recantos paisagísticos belíssimos, com águas mansas ideais para a natação, o remo, a vela e outras atividades sociais e desportivas, temos de perguntar: até quando? Nossa baía está pedindo socorro e ninguém a ouve. Falta estudá-la, conhecê-la e vivê-la, mas tudo isso precisa, no mínimo, de atenção, de um olhar curioso, de um sentimento de amor por ela. Não, para transformá-la em mais um palco de eventos saracoteantes (a juventude baiana parece só gostar disso e não ser capaz de mais nada, além de balançar-se). É necessário a baía no seu potencial turístico cultural, intelectual, primeiro atraindo os que usam o cérebro, depois os que gostam das atividades físicas. Nada se fará, no entanto, se não se promover a implantação de estruturas viárias e planejamento urbanístico compatível com as necessidades turísticas, que exigem níveis elevados de segurança e prazer.

Assim, com o apoio do Gabinete Português de Leitura e do Yacht Clube da Bahia (cultura histórica e desporto náutico), foi lançada neste ano a Semana da Baía de Todos os Santos (28 de outubro a 05 de novembro). Um passo inicial, com eventos realizados nas duas instituições. Em 2011, a baía estará completando 510 anos de descoberta. Temos um ano pela frente, para criar eventos, programar atividades, realizar estudos e pesquisas e fazer convergir para essa semana todos os resultados dos esforços de quantos comungam com essa idéia de promovê-la em Salvador e no Recôncavo, com repercussão em todo o Estado, em todo o País e no Exterior. Sim, resultados, porque há que se trabalhar sempre e continuamente com esse objetivo. A Semana é de comemoração e divulgação de resultados do que se fez durante todo o ano. Fica, aqui, portanto, a convocação e o desafio: você gosta da Baía de Todos os Santos? O que pode fazer por ela? Que tal começar por conhecê-la melhor, estudando sua história e sua geografia, mas também buscando os seus lugares, a sua gente, os seus cantinhos de mistérios e prazeres?