sexta-feira, 15 de novembro de 2013

MEDO E PRECONCEITO



Crônica científica

 

Estamos em frente a um quadro assustador, nas Filipinas, como tem ocorrido natural e eventualmente, aqui e ali, em todo o planeta, sucessivamente. Quem se tem perguntado como seria o tão temido "fim do mundo" pode fazer uma imagem próxima da real, apenas juntando eventos desse porte, admitindo que ocorram simultaneamente, um tufão aqui, um grande terremoto ali, um vulcão importante acolá. Felizmente, é pequena, pequeníssima, a probabilidade de que tal tragédia, de âmbito mundial, nos atinja, aos que estão vivos neste momento, mas já ocorreu algumas vezes e certamente ocorrerá em outras tantas. Inclusive por causas externas, como a queda de um grande asteroide ou por uma chuva deles, pequenos, tão pequenos que não os podemos detectar a tempo de se tomar alguma providência, com os atuais aparelhos que dispomos na Terra e em órbita. Há um grosso livro do imortal Isaac Asimov, cujo título - Escolha a Catástrofe - nos indica incontável número de possibilidades de tais ocorrências. Não estraguemos o nosso feriado de hoje, contudo, com esse medo em nosso cardápio. O medo, sabemos todos, é filho da ignorância e parente da impotência que limita nossas ações em determinadas situações. É salutar estar com ele - não devemos morrer por imprevidência - mas é doença cultivá-lo e sempre que possamos, cabe-nos afastá-lo com a poderosa arma da informação. O ignorante morre na véspera.

 

Assim, o medo só deve ser usado como alarme, sempre ligado, associado à previdência, que só existe, com informação, muita informação, cada vez mais informação, que costuma ser negligenciada por uma atividade social intensa e até irresponsavelmente divergente, quando se dedica todo o tempo fora do trabalho, à diversão. Dias atrás, vendo e ouvindo o principal noticiário matutino de Salvador, numa sexta-feira como hoje, foi-me dada, como agenda, a programação cultural da nossa cidade para o fim de semana. Todos os eventos estavam associados, de alguma forma, a movimentos de pés e de nádegas. Nada mais. É o caso de perguntar: e no cérebro, não vai nada? O condicionamento nessa direção é tal, que, qualquer tentativa em conduzir uma pessoa para algum tipo de informação e análise, é afastada sumariamente. Isso me faz lembrar outros tempos, quando na minha primeira juventude - já se foram seis décadas, desde então - tínhamos a opção, nas manhãs de domingo, de uma sessão promovida pelo clube de cinema no Cine Liceu, com o privilégio de ouvir antes da projeção do filme, um comentário crítico do grande Walter da Silveira, a chamar a atenção para o movimento da câmera em determinadas cenas e a iluminação em outras, entre tantas possibilidades de "ver" o que os desinformados sequer desconfiam que existe em um filme de bom diretor.

 

A verdade é que nossa sociedade caminha para transformar indivíduos potencialmente cultos em massa disforme de pessoas que valem apenas como números estatísticos. Na educação, por exemplo, o que vale hoje não é a capacidade de ler e interpretar, por exemplo. Muito menos ainda, a de fazer cálculos mais avançados que os meramente aritméticos. O que vale são as estatísticas que apresentam números crescentes de concluintes em diversos cursos, ainda que se saia da escola sem saber nada, porque a ordem do sistema aos professores é uma só: aprovar todos os matriculados, porque se precisa de salas e cadeiras para outras turmas no ano seguinte... Isto também é fim do mundo! O que se colhe com o aumento desenfreado da população, porque se precisa de cada vez mais corpos humanos para as "almas" (de anima, movimento) dos animais que morreram - cães de apartamentos, por exemplo - e que, assim, voltam como gente. Falando (ou escrevendo) coisas tais, colhe-se o patrulhamento dos "intelectuais" de plantão que adoram a palavra "preconceito" e a carimbam em todas as testas disponíveis à sua frente. Quem vê um ser humano latindo na rua e diz que ele é um cão em sua primeira encarnação como homem, para atender o aumento de corpos humanos na Terra, pode ser processado por preconceito, por alguém que tem algum medo cravado em seu cérebro e teme ser atingido por alguma observação desse tipo. Hoje, é muito difícil fazer ciência, porque esta não se faz sem ter hipóteses antes das teses. Há sociólogos (políticos ideológicos) que fazem sua ciência apenas com emoção, paixão, não raramente cultivada num jardim de traumas de infância. São estes, sempre de plantão nas esquinas, prontos para assustar quem as dobra, os que pregam a palavra "preconceito" em tudo que é contrário à sua própria visão, por medo de ligar a luz. Costumam ser os mesmos que querem ainda mais gente no mundo, porque é na ignorância e no caos que conseguem cultivar sua política barata e demagógica, baseada no ódio, num cérebro cheio de preconceitos, isto é, de afirmações baseadas apenas na paixão, sem qualquer hipótese científica a sustenta-las. Como se pode deduzir, há muitas possibilidades de se ter uma catástrofe. Quanto ao mundo, cientificamente, pode mudar o seu cenário e seus ocupantes, mas nunca se acaba.

 

Adinoel Motta Maia

 









sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A ARTE DE FECHAR OS OLHOS


Crônica Científica

A notícia de ontem, na televisão, dizendo que a Terra está sofrendo um bombardeio de pequenos asteroides, é sem dúvida, assustadora, Nenhum de nós está livre, na Terra, de ter um deles a explodir em nossa atmosfera, chovendo pedra e/ou ferro em nosso quintal. Ou, o que pode ser pior, do choque de um deles, inteiro, no centro de uma cidade grande, por exemplo. A notícia acima referida fala de mais de mil mortos na Rússia, dias atrás, quando ocorreu tal explosão sobre uma pequena comunidade. Os grandes asteroides estão sendo monitorados pela ciência telúrica, de modo que, catástrofes como a do desaparecimento dos dinossauros e por um tempo, de todas as demais espécies animais, na superfície de nosso planeta, ocorrida há dezenas de milhões de anos, sendo hoje possíveis, talvez possam ser evitadas, se tivermos tempo de mandar algo ao seu encontro, capaz de desviar sua trajetória. Os demais, de relativamente pequeno porte, não são monitorados, porque são muitos e não facilmente detectáveis a tempo de se tomar qualquer providência. Estamos, portanto, ao sabor do azar.

Dir-se-á que cada um de nós pode morrer a qualquer momento na rua violenta das cidades brasileiras, com muito maior probabilidade do que com a chegada de um asteroide. Pura verdade, que leva muita gente a preferir as novelas do que os noticiários de televisão, fechando os próprios olhos para tudo e vivendo na ignorância. Por outro lado, há a verdade também muito verdadeira de que um dia será o último de todo indivíduo animal na Terra, por razões naturais, inclusive com limite que nos é dado pela glândula pituitária, responsável pelo controle da reprodução celular, que só seria garantida até os 144 anos de vida, no homem. A boa notícia é que após uma vida há outra, mas muitos de nós não acreditam nisso porque estão condicionados por igrejas que confundem tudo, afirmando o que não deve ser afirmado, que só temos uma vida, após o qual o destino é definitivo para a nossa "alma" (seria mais correto dizer "ego", porque alma vem de anima, que significa movimento e corresponde à força que dá movimento aos animais, os únicos seres que se movem). Este é um dos maiores fatores que estimulam a corrupção, entre tantas formas de criminalidade, porque há idiotas que dizem: "Se só tenho uma vida, vou gozá-la da melhor forma possível". Isso não justifica, mas explica porque vivem como se estivessem numa luta de "vale tudo", contra todos. Ao contrário do que dizem essas igrejas, não há perdão para quem não sabe o que faz, justamente porque não se sabe o que se faz por causa de sua própria ignorância, por preferir a diversão à informação.

Sem ciência, não há salvação.

Não nos esqueçamos jamais, que o hoje é o amanhã do ontem, como é o ontem do amanhã. Algo tão óbvio costuma não ser considerado pela maioria das pessoas, que não constroem hoje o seu amanhã, esperando que tudo caia do céu ou do programa "bolsa-família", obra de governo que estimula a preguiça, a acomodação e  pobreza, mantendo os ignorantes sob o controle dos políticos. Tem gente que se orgulha de receber essa esmola. Fala-se que isso é amor do governo pelos pobres. As igrejas também costumam confundir o que é amor, trocando causa com efeito. Mais uma vez, falta de ciência e estímulo à ignorância, porque todo gado precisa de vaqueiros. Depois que os poetas perderam a Lua para os astronautas e as estrelas para os telescópios em órbita da Terra, é a vez de aceitar o amor como força de atração entre as partículas subatômicas (na Física isso tem o nome de força fraca ou, como diz o físico Jean Charon, "espírito") que formam não só os átomos como todos os corpos. Vê-se que o mundo está cada vez mais excitante para os cientistas e perdendo a graça para os artistas. O que é mais uma razão para trocar o samba-de-roda pelo Google, como atividade de cultura e lazer. Mais estímulo para o cérebro, que comanda, do que para as nádegas, que obedecem.

Adinoel Motta Maia

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

A BTS E O GOLFO DA BAHIA


Crônica científica

Alguém pode estranhar a ocorrência de uma missa a encerrar um evento científico, porque há um preconceito de que não se mistura Ciência com Religião, isto é, Razão e Fé. Preconceito, sim, porque se faz um conceito sem examinar cientificamente - esgotando todas as abordagens possíveis - o que se entende por Fé ou Religião. Diga-se que a culpa disso é apenas dos religiosos que preferem impor suas afirmações sem submetê-las à investigação científica, mas, por outro lado, há uma postura dos cientistas em menosprezar a paixão como algo totalmente fora do escopo da investigação objetiva dos laboratórios, restringindo-a aos limites da subjetividade, isto é, das construções da mente. Este divórcio pré-estabelecido por conveniências, digamos, burocráticas, ao longo dos milênios de cristianismo e islamismo derivados do judaísmo é responsável pela recusa digamos puramente dogmática da ressurreição contínua do ego eterno - alma, para uns; espírito, para outros - em sucessivas ligações com diferentes corpos animais, em permanente evolução. Nesse contexto, observe-se que cresce bastante uma outra postura, de intelectuais independentes, de origem familiar cristã, na direção do ateísmo ou do chamado espiritismo não cristão, que tangencia religiões mais antigas, como o hinduísmo e o budismo, entre outras, onde se exercita uma prática experimental - científica, portanto - de projeção da mente objetiva (do cérebro), fora do corpo.

Estas palavras introdutórias se devem à realização de uma missa, hoje, dia de Todos os Santos, às 8 horas da manhã, na Igreja de São Pedro, no Largo da Piedade - com o competente sermão do Padre Aderbal - como tem ocorrido desde 2010, comemorando os 512 anos da descoberta da Baía de Todos os Santos, assim denominada pela expedição do português Gonçalo Coelho, com três naus - as duas outras com Gaspar de Lemos e Amerigo Vespucci, vinda de Portugal com missão exploratória desde o Rio Grande do Norte até onde terminassem as terras dessa costa que já sabemos irem até a Patagônia, no extremo sul da Argentina. Não há no Brasil uma popularização de "Todos os Santos", conforme instituídos pela Igreja Católica e festejados em países como Portugal e Itália, onde existem paróquias a eles dedicadas - o próprio Vespucci teria sido batizado numa delas, em Florença - nesta data de 1º de novembro, aquela em que a frota portuguesa aqui chegou, em 1501. Essa missa encerra a Semana da Baía de Todos os Santos, realizada anualmente pelo Gabinete Português de Leitura, com uma exposição e três palestras em sua sede, desde 2010, a partir de 26 de outubro. Um evento científico, como dissemos, que se encerra com um ritual religioso, católico, na paróquia de São Pedro, onde se situa a sede do Gabinete Português de Leitura.

Neste ano, a exposição foi realizada pelo geólogo Rubens Antônio da Silva Filho, dando notícias, já, de um trabalho que realiza com modelos reduzidos em três dimensões, reproduzindo o relevo de Salvador, sua geomorfologia. Atuando no Museu Geológico da Bahia, esse cientista experimenta esse modo para o aprendizado de pessoas com deficiência visual, que andam pela cidade e a vêm com os próprios pés, podendo agora senti-la na ponta dos seus dedos, percorrendo vales e colinas feitos em escala dupla - horizontal e vertical - assim "vendo" a cidade como se fosse em um mapa. Ainda em desenvolvimento, esse trabalho parece ser inédito e é científico, mas o seu alcance social o faz merecer todo o apoio, principalmente de divulgação, contra a cegueira dos que tratam os deficientes visuais apenas politicamente.  As três palestras realizadas - também científicas - foram programadas para mostrar como a geologia fez a geografia e nesta ocorreram os fatos históricos, particularmente os relacionados com os transportes, na Baía de Todos os Santos. A primeira delas, a cargo do Prof. Dr. José Maria Landim Dominguez, do Instituto de Geociências da UFBA, mostrou como surgiu e evoluiu a Baía de Todos os Santos, geologicamente. Referência nacional em sua área científica, o Prof. Landim encheu os olhos e os cérebros de um auditório lotado, que viu as imagens projetadas e ouviu suas palavras reveladoras de um passado de eventos assustadores que formaram a belíssima baía que pode ser a maior do mundo e não sabemos disso, nem a conhecemos, unicamente por preguiça crônica. Só é pobre quem quer...

Na segunda palestra, do geólogo Rubens Antônio, este deitou e rolou com o seu magnífico trabalho de reprodução em três dimensões da cidade de Salvador, projetando imagens desta com seus prédios e suas vias, mas logo desnudando-a, sem eles, como foram encontrados seus vales e colinas, apenas com a vegetação a revesti-los. Autor de um livro, que logo ganhará segunda edição, sobre a história da geologia na Bahia, esse cientista mostrou essa história que os baianos lamentavelmente não conhecem porque não querem. A terceira palestra, sob nossa responsabilidade, montou nesse palco geológico e geográfico da Baía de Todos os Santos, a história dos seus meios e vias de transporte, com ênfase na sua travessia e na contribuição para sua economia, desde os saveiros até o ferry-boat, desde os anos 50 do século passado, quando se começou a sofrer as pressões do poder econômico do petróleo e da indústria automobilística, desmontando a infraestrutura ferroviária e o transporte marítimo em benefício do automóvel. Mais que isso, no entanto, pudemos revelar, com base na ciência geológica confirmada pelos palestrantes anteriores, uma omissão dos geógrafos, que até hoje não descobriram o Golfo da Bahia, que temos em nosso litoral e que é formado pelas baías de Todos os Santos, de Cairu e de Camamu, num único conjunto geológico revelado nesta IV Semana da BTS e que não é outra coisa, se não um golfo. Estamos pedindo um congresso brasileiro que nos permita mostrar esta descoberta assim tardia e exibir para o mundo, nos mapas oficiais, sua presença na costa brasileira, oficializando-a. Sobre este assunto, remeto os interessados para o meu blog http://adinoel-blogart.blogspot.com, onde se encontra um primeiro artigo pequeno, mas completo, sobre essa descoberta.
 
Adinoel Motta Maia