sexta-feira, 31 de maio de 2013

O DIREITO DE NÃO QUERER SABER


Crônica científica

O respeito ao próximo (e ao afastado) começa com o reconhecimento ao seu direito de ser como é e de querer o que quer - apenas o que quer - podendo-se considerar uma agressão, a oferta do que ele não quer. Isto vale para um produto industrial, uma oferta comercial ou uma informação qualquer, seja esta jornalística ou cultural. Quem ainda não ouviu a expressão "Eu não quero saber disso"? Muita gente tem a fama de "chato" justamente por insistir em passar para outras pessoas o que ele sabe e valoriza, sem respeitar o direito de recusa, dos demais. Uma variação desse procedimento está no cotidiano de todas as pessoas, quando alguém em sua casa ouve um grito que vem da sala de estar (o famoso living), mais ou menos assim: "Ligeiro! Venha ver!" Imagino em quantas casas, na manhã de hoje, em frente ao televisor, alguém fez isso, querendo compartilhar com os demais membros da família as indescritíveis imagens proporcionadas pelo final do jogo de futebol da noite anterior, no seu último minuto, como nos filmes americanos, quando um goleiro classificou a sua equipe para o último jogo do campeonato, defendendo milagrosamente (não é força de expressão) um pênalti, num voo incrível, não com as mãos ou o peito ou as pernas, mas com a ponta - repito, a ponta - da botina em pleno ar, mais elevada do que qualquer parte do seu corpo.

Ora! Existe quem deteste futebol e é natural que muitos tenham ignorado o chamamento ou mesmo reclamado por ter sido atraído para "aquilo". Parece um comportamento de alienação e na realidade o é, mas é também um direito da pessoa, dentro da sua gama de interesses, de cultura, de posicionamento social, político ou religioso, enfim, da sua autodeterminação, que está intimamente ligada ao degrau da escada que sobe, na evolução do seu ego. O nível de interesse de qualquer pessoa é o mesmo daquele em que se encontra o seu degrau. Muitos conflitos, até violentos, que testemunhamos nestes dias de superpopulação na Terra, poderiam ser evitados se houvesse esse respeito ao próximo (e ao afastado) e ninguém quisesse trazer para o seu time, o outro. Por outro lado, concordamos, sem dúvida, que muita briga poderia ser evitada se todos tivessem um pouco mais de conhecimento do que aquele, que cultiva. Isto, no entanto, é algo que só se resolve com paciência, plantando-se à margem do caminho por onde todos passam e deixando que cada um se sinta atraído pela planta. A verdade é que não há salto que permita passar do terceiro degrau para o centésimo, num só movimento. Por isso, como nos disse Jesus, é preciso ressuscitar muitas vezes, vida após vida, como fazemos na escola, ano após ano, curso após curso, sofrendo com os sucessivos exames que aprovam ou reprovam, dizendo ser esse o caminho da salvação, que nos leva ao reino de Deus. A escada até lá é muito longa e difícil.

A lição que podemos extrair dessa análise, é que não temos de convencer ninguém a gostar do que gostamos. Vamos atrair para nosso time apenas as pessoas que já estariam nele se soubessem da sua existência. As que se aproximam naturalmente, porque precisam de conhecimento como todos precisamos de ar e de água. Seja esse time de aficionados da musica, do cinema ou da ciência. Os clubes de ciência chegaram a ser mania no pós-guerra (segunda guerra mundial), principalmente nos Estados Unidos, onde já havia uma tradição nesse campo. Revistas de ciência e de ficção científica eram vendidas nas bancas como se vende hoje as pornográficas. Mudou o que? A quantidade de pessoas. A alma pode se multiplicar infinitamente porque é apenas a força que promove o movimento (anima) encontrada em todos os animais, sejam, assim, quantos surjam, por mera reprodução. Já o ego, é fruto da evolução da consciência que cria o intelecto e o desenvolve por meio da informação, aumentando assim a inteligência na medida em que o cérebro ganha mais memória e maior velocidade de procedimento dos dados nela depositados. Simples, não é? Quantas pessoas sabem disso? Quantas pessoas querem saber isso? Não temos de nos preocupar com as que não querem, mas apenas identificar as que querem e nos aproximarmos delas. As demais, ainda não motivadas, não estão preparadas intelectualmente para gostar de ciência. Não querem saber, por exemplo, que é justamente com o aumento da capacidade de memória e da velocidade do processamento de dados desta, que evoluem intelectualmente e se preparam para substituir a inteligência pela sapiência, que, pelo que se lê nos dicionários, é o conhecimento divino.

Uma outra notícia que está hoje nos televisores é o de uma ação de reintegração de posse de uma propriedade invadida pelos índios, que acham que a terra é deles, por ter sido tirada dos seus antepassados. Sob esse argumento, sim, todos os descendentes de índios, geneticamente comprovados, teriam direito de herança de terras compatíveis, em área, com as ocupadas pelos índios expulsos e mortos no processo de colonização. Terras selvagens, evidentemente, sem as benfeitorias feitas com o dinheiro dos impostos pagos durante todos esses anos e os investimentos realizados por quem construiu casas, estradas, açudes, etc. nelas. Essa notícia, como a do futebol, também é setorial, mas tem um cunho social com toda a carga de emoção que se transmite mais facilmente do que aquela cultivada como razão. A manipulação das emoções é um campo explorado pelos políticos que promovem a ignorância, negando educação ao povo. Um índio morto em conflito é "pano pra manga" de muitas roupas feitas sob medida. A emoção promove a guerra. A razão promove a paz. Tudo é um questão de escolha. A mesa está servida. O cardápio é vasto e variado. Cada um come o que quer e vai para onde quer. Esta é a premissa, na lei da evolução.

Adinoel Motta Maia