segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O ESPAÇO DA CIÊNCIA

Crônica

 Esta crônica das sextas-feiras está com atraso de dois dias, porque passei cinco deles na organizada, limpa e bem iluminada João Pessoa, a capital da Paraíba, aonde fui para me isolar e fechar a trama de A Trilha dos Santos do Mundo, o último romance da trilogia Nortada, que deverá chegar às livrarias no dia 21 de dezembro de 2012, no solstício de verão, aqui, no Hemisfério Sul. Assim, no dia 22 de setembro, no equinócio da primavera, eu estava ali, na Estação Ciência, cerca de 40 metros acima do nível do mar, na Ponta do Seixas - o ponto oriental extremo da América do Sul - cujas falésias de argila estão desmoronando pela ação das ondas, que já destruíram totalmente as alvenaias de pedra que sutentavam a elevada pracinha de Iemanjá - justamente a Rainha do Mar - separando aquela ponta da Praia do Cabo Branco, extremo urbano Sul da cidade, onde me hospedei para meditar, andar e - por que não? - comer peixe, camarão e carne do sol.

Era sábado e as 4 horas e meia, na madrugada, acordei para ver pela janela envidraçada, à minha frente, o Oceano Atlântico e imaginar, além do horizonte, a África. Um dos dois únicos dias do ano em que o dia e a noite têm exatas doze horas (equi, em grego, significa igual), naquele momento a luz solar já inundava o céu. É ali, o ponto onde o dia começa mais cedo, em toda a América do Sul e esse conhecimento geográfico nos leva a refletir sobre o nosso planeta a navegar no espaço cósmico sob a ação de forças gravitacionais gigantescas, ele atraído pelo Sol e este, pelo núcleo da galáxia, pondo tudo em movimento frenético que mal percebemos porque também são enormes as distâncias entre os planetas e entre as estrelas.

Naquele dia, às 9 horas, saí para o calçadão da Avenida Cabo Branco, iniciando minha caminhada em direção ao Sul e subindo para a Ponta do Seixas, com o objetivo de visitar a Estação Ciência, num maravilhoso conjunto arquitetônico e urbanístico dedicado às ciências e às artes que deveriam estar em prédios separados, mas que, infelizmente, sofre um processo de dominação artística com o "espaço-ciência" invadido por exposições fotográrica, de pintura e tapeçaria e de escultura, homenageando figuras da música popular, da ação social e até da política. O belíssimo prédio de fachadas geométricas espelhadas, tão leve que parece voar, preso ao solo por rampas externas, assim, em si, uma obra de arte, feito para o Espaço Ciência, tem apenas menos da metade de um de seus dois pavimentos aproveitado para um projeto universitário de robótica, um mini-planetário para não mais de dez pessoas deitadas no chão e algumas cadeiras em frente a um monitor onde se presume poder ver documentários científicos. Só isso...

Este é um sério problema não só da Paraíba. O povo brasileiro, por inteiro, está sendo conduzido pela mídia eletrônica e pelos políticos em funções administrativas para uma alienação científica danosa ao intelecto e ao corpo humanos. A informação que aumenta o conhecimento e a capacidade de raciocínio nos cérebros está sendo minimizada em benefício da emoção fácil que atrai as massas de cordeiros assim facilmente manobradas por seus pastores, sejam os políticos, sejam os religiosos, sejam os promotores de venda (anúncios publicitários e patrocínios) na mídia eletrônica, com forte apelo aos apetites sexual, visual e auditivo através da música e das artes cênicas ou plásticas. Tudo isso se reflete no comportamento social, na perda de saúde física e mental e na idiotização do povo, com elevado prejuízo para a evolução do ego e acelerado processo de massificação que transforma homens em animais (a palavra grega anima significa movimento) que cultivam apenas o próprio corpo.

Tudo isso deveria estar sendo explicado em muitos "espaços-ciência" em todo o Brasil, inclusive nas escolas, formando indivíduos capazes para constituir sociedades sadias e prósperas, ao contrário do gado humano que declaradamente é chamado de cordeiros ou ovelhas por diversos tipos de pastores.
A presença da arte nos espaços da ciência, portanto, faz parte do processo de atração dos poucos indivíduos que buscam o conhecimento, desviando-o no seu próprio ambiente para a emoção e a paixão proporcionadas pelas artes. Nada contra estas, desde que não contribuam para a animalização dos intelectuais. Evidentemente, Arte também excita o intelecto na medida em que valoriza os símbolos e a interpretação destes, estejam eles na Literatura, na Pintura, na Escultura, na Música, na Dança ou no Teatro. Não se deve estar contra essas manifestações, mas se deve, sim, estar contra a invasão do espaço da ciência por elas. Sem a ciência, sem a razão, sem o mistério e a investigação, o homem perde o lado direito do seu cérebro e volta à animalidade. Os animais também fazem arte (basta ver os desenhos que estão nas conchas das praias, por exemplo, alguns mais belos que os de alguns artistas humanos), mas, na superfície da Terra, só os humanos são cientistas, filósofos e místicos.

Adinoel Motta Maia